quinta-feira, janeiro 22, 2009

Memórias do Baú CXXXII - O Curso de Pára-quedismo

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domingo, janeiro 04, 2009

O Que Há Num Número?

Quando entrei para o Colégio, já ia preparado para todos os aspectos relacionados com a vida militar, tais como a farda, as formaturas, a ordem unida, a disciplina, etc. Sabia também que ia ter um número, que a minha mãe tinha bordado em todas as peças do meu “enxoval”.

O que não sabia é que esse número ia passar a ser a minha identidade. Ia-se acabar o “Pedro” da escola primária e ia passar a haver o “três-cinco-sete”. “Três-cinco-sete” para os graduados, “três-cinco-sete” para os professores e oficiais, e até “três-cinco-sete” para os outros miúdos de dez anos que tinham entrado comigo, e que, como eu, abdicaram das suas identidades para serem tratados por números. Isto ao princípio fez-me muita confusão, mas acabei por me habituar.

Algumas semanas depois, começaram a chegar ao Colégio cursos de Antigos Alunos que comemoravam aniversários de entrada ou saída, e cada Antigo Aluno queria conhecer o aluno que tinha o mesmo número que ele tinha tido, trazia uma lembrança para ele, almoçava ao lado dele e conversavam como se tivessem sido companheiros de carteira no Colégio. E tudo isto porque ambos partilhavam o mesmo número no Colégio, e o mais antigo era designado por antecessor e o mais novo por sucessor. Percebi que os Antigos Alunos que não tinham sucessor ficavam decepcionados, e comecei a ficar decepcionado de cada vez que havia uma visita de um curso e não havia um antecessor meu.

A pouco e pouco, fui-me apercebendo de que havia uma mística associada aos números que não era fácil de explicar.

Havia situações em que os alunos “herdavam” os números de familiares (pais, avós, tios, etc.), sendo o número considerado uma espécie de “património familiar”. Os alunos que tinham números que tinham pertencido a figuras de destaque em termos militares, políticos, ou outros (números por vezes escolhidos de propósito pelos pais), ou aqueles cujos antecessores tinham tido graduações de destaque, sentiam um orgulho especial, como se o número lhes transmitisse uma parte do mérito do antecessor.

Mas o mais inexplicável são os laços que se estabelecem entre Antigos Alunos de diferentes gerações que não têm como base família, gostos, afinidades ou experiências pessoais, mas apenas o facto de, na maioria das vezes por mero acaso, terem partilhado o mesmo número no Colégio. Há até Antigos Alunos que organizam jantares entre todos os camaradas que tiveram o mesmo número.

Foi numa visita ao Colégio realizada em 2003, para comemorar os 25 anos de entrada, que conheci o Nuno Bragança, um dos meus sucessores. Apesar das dificuldades iniciais – os alunos têm alguma dificuldade em perceber que os Antigos Alunos (pelo menos quando vão ao Colégio) têm a mesma idade que eles – cedo se estabeleceu um bom relacionamento e a tradicional cumplicidade entre quem partilha a vivência do Colégio.

Contactei-o mais tarde, já como graduado, e algumas vezes depois de ter saído do Colégio, para saber como as coisas lhe estavam a correr, disponibilizando-me para o ajudar no que fosse preciso.

Ninguém merece partir tão cedo, e o falecimento de um jovem é sempre um choque, mas este para mim foi um choque especial, por motivos que a maior parte das pessoas talvez não compreenda nem me reconheça o direito a ter.

À família e aos amigos, deixo a expressão do meu profundo pesar por esta sua perda; para o meu sucessor, o 357/97, fica um abraço especial do 357/77. A sua memória ficará para sempre comigo.